Passei 72 horas como neo-Luddite — o que aconteceu quando troquei o iPhone pela ligação cara a cara
Há alguns fins de semana, dei-me a um desafio que me fez agarrar as minhas pérolas de zillenial: um pedido dos meus editores para trancar o meu telemóvel por 72 horas. Tendo crescido com a primeira geração que mal se lembra de vida sem telemóveis (e sim, sei que muita gente que não se lembra vai olhar de forma reprovadora), como a maioria dos que estou a conhecer na casa dos 20 e poucos anos, eu trato o telemóvel como nada menos que um apêndice extra: um escritório portátil, hub social, rastreador de finanças e bancada de notícias embrulhados num parceiro digital de bolso que raramente deixo em casa. Embora eu nunca tenha dado grande importância à posse do modelo mais recente (o meu círculo íntimo sabe que usaria o meu iPhone 12 riscado até ao fim do tempo, se a Apple assim mo permitisse), usar um smartphone tornou-se uma necessidade para cumprir as minhas tarefas diárias. Para além de ser uma linha de contacto para amigos e família, para postar fotos, percorrer a Amazon e ver reels de stand-up no Instagram, o meu desafio era ficar sem o meu dispositivo por três dias inteiros. Eu iria redescobrir o que é viver num mundo sem telemóvel e comunicar com os outros sem ecrãs — se tal tarefa seria mesmo possível nesta era hiper-digital. Inicialmente, entrei em pânico: é Halloween weekend! tenho planos! Como raios hei de navegar pela cidade de Nova Iorque sem o meu telemóvel?! Mas lembrei-me de que não era exatamente território inédito. Neo-Luddismo — que há cerca de 30 anos era vida normal para muitos, e hoje é um movimento crescente de pessoas que evitam a tecnologia de forma passiva, a contestá-la ou situam-se no meio — está a ganhar força. Embora o grupo não seja oficialmente um clube, existem organizações como a Kanso Digital Wellness e The Reconnect Movement (que não se classificam explicitamente como neo-Luddite, mas partilham de muitos dos mesmos princípios) que surgem pelo país com eventos e experiências sem telemóvel. Estes grupos assumem uma postura cética em relação à dependência socialmente enraizada da tecnologia moderna, reconhecendo a sua necessidade, ao mesmo tempo que visam melhorar a nossa relação com ela. Os encontros criam também ambientes onde o foco é a ligação cara a cara. Tiffany Ng, uma escritora de 24 anos que gere a newsletter Substack Cyber Celibate e cuja experiência de agosto de prender o telemóvel a uma parede durante uma semana gerou 1,8 milhões de visualizações no Instagram, orgulha-se de dizer que é neo-luddite. > "Eu sei que essa palavra é muito intimidante para algumas pessoas, e que pode ser vista como hipócrita às vezes," Ng disse-me. "Estou a chamar-me assim, e ainda assim tenho uma conta de Instagram. Mas há um espectro … eu adoro o termo ‘neo-Luddite’ porque incentiva as pessoas a terem conversas sobre o que significa reduzir o uso da tecnologia e ser mais consciente com o nosso consumo." O fundador da Airbnb, Brian Chesky, sustenta que os nossos hábitos de consumo atuais — que incluem a irresistível tentação de verificar dispositivos no trabalho — já saíram do controlo. "Estas coisas são ferramentas. Não são nem boas nem más, inerentemente — é o que fazemos com elas", disse Chesky. "O uso excessivo é um problema. Não acho que o telemóvel seja um problema. Acho que a quantidade de tempo que olhamos para um telemóvel é que é um problema." Para enfrentar o meu próprio uso excessivo do telemóvel, decidi agarrar o touro pelos cornos e aceitar este desafio de neo-Luddite com o meu próprio experimento. Depois de definir os perímetros — telemóvel fora à meia-noite, portátil apenas para trabalho — e de algumas horas de preparação, eu fiz a versão zillenial do impensável: desliguei o telemóvel. Aqui fica como correu.
In This Article:
- Neo-Luddismo hoje: por que cada vez mais gente rejeita a dependência tecnológica
- Planear o experimento: regras, perímetros e a preparação final
- A primeira noite sem telemóvel: logisticеs, nervos à flor da pele e uma última baldeação online
- O domingo de reconexão real: encontros, fotografia analógica e menos notificações
- O fim de semana: domingo de reconexão, lições e o regresso à vida real
- Conclusões: o mundo real é maior que a tela e a vida não espera pelo próximo like
Neo-Luddismo hoje: por que cada vez mais gente rejeita a dependência tecnológica
Há décadas, o neo-Luddismo era visto como uma espécie de resistência de nicho; hoje torna-se uma pauta mais ampla em várias cidades. Organizações como a Kanso Digital Wellness e The Reconnect Movement promovem encontros onde o foco é a proximidade humana sem a tela.\n\n> "É sobre apresentá-lo a pessoas significativas que, esperançosamente, se tornarão peças centrais de seu tecido social, para que você possa passar mais tempo fazendo coisas divertidas que melhorem a sua vida — em vez de rolar em isolamento", descreveu Randy Ginsburg, fundador da Kanso Digital Wellness, quando falamos sobre a minha experiência.\n\nA ideia é simples: as tecnologias são ferramentas. O problema não é a tecnologia em si, mas o tempo que passamos a utilizá-la sem pensar. A escritora Tiffany Ng afirma:\n\n> "Eu adoro o termo ‘neo-Luddite’ porque incentiva as pessoas a discutir o que significa reduzir o uso da tecnologia e ser mais consciente com o nosso consumo."\n\nNo entanto, a gestão consciente da tecnologia é um objetivo de muitos estudos e empresas. O CEO da Chesky, Brian Chesky, reforça: “Overuse is an issue. I don’t think the phone is a problem. I think the amount of time we stare at a phone is a problem.”
Planear o experimento: regras, perímetros e a preparação final
Para enfrentar o meu próprio uso excessivo, defini os perímetros — telemóvel longe à meia-noite, portátil apenas para fins de trabalho — e preparei o terreno por algumas horas. O ponto alto foi desligar o telemóvel pela primeira vez, o que marcou o início do meu período sem telemóvel. • O que fiz na preparação: - Desliguei o telefone à meia-noite. - Usei o relógio Garmin para acompanhar as horas, desligando notificações inteligentes para manter a experiência o mais pura possível. - Planifiquei a saída para a festa de Dylan no East Village, utilizando o Apple Maps para saber como chegar, sem depender de apps de ride-sharing. "Quando o relógio marcou meia-noite, apertei os botões do iPhone para o desligar. A tela ficou preta num instante com um toque cerimonial." Esta parte do experimento mostrou que a logística de ficar sem telemóvel não é apenas uma questão de vontade: envolve planeamento real e recursos que o deixam mais humano.
A primeira noite sem telemóvel: logisticеs, nervos à flor da pele e uma última baldeação online
Quando finalmente chegou a meia-noite, segurei os botões de ligar/desligar e desliguei o telemóvel. Foi uma espécie de cerimónia silenciosa, que me deixou sem o meu conforto tecnológico, mas com a certeza de que poderia adaptar-me. A manhã seguinte trouxe uma surpresa: ao chegar ao quarto, percebi que o meu carregador tinha ficado na ‘prisão do telemóvel’ — uma prateleira de loiça — no dia anterior. A indesejada irritação começou logo cedo: como iria manter a desconexão sem o meu ritual de descompressão?
O domingo de reconexão real: encontros, fotografia analógica e menos notificações
Mais tarde, visitei uma mercearia de facto para comprar câmaras descartáveis para registar memórias do evento de Dylan com um toque vintage. A CVS onde fui acabou por ter câmaras por 22,79 dólares, embora a colega mais jovem olhasse para mim com curiosidade quando perguntei. No regresso a casa, consegui concentrar-me melhor sem a enxurrada de notificações e, pela primeira vez em meses, consegui trabalhar com mais foco. O silêncio digital fez milagres na minha concentração. A festa de Dylan foi marcada por pouca dependência de telemóvel e muita conversa face a face. O meu disfarce de placa e abacate — o traje feito em casa para a expressão “Holy guacamole!” — ajudou, mas a melhor parte foi perceber que a presença verdadeira é mais potente do que o ‘postar’ a cada instante. > "In New York? That’s crazy!" foi a reação mais comum entre as pessoas à minha volta quando eu explicava o que estava a fazer. No entanto, ao falar com Ramandeep Rekhi, um cientista clínico de 30 anos na Stanford University que conheci na festa, ele partilhou: > "I’ve been trying to reduce my phone time, in general, but especially when I’m around other people. I try to actually spend time with them and not stare at a screen the whole time."
O fim de semana: domingo de reconexão, lições e o regresso à vida real
Entre as duas jornadas, o estudo da University of South Australia citado na Healthcare sugere que pode levar cerca de dois meses para mudar um hábito. Ainda assim, notei mudanças significativas no meu comportamento ao longo dos dois dias seguintes do experimento. Os meus pais vieram à cidade para me ver no domingo, então quebrei a regra de apenas trabalhar no portátil para coordenar o brunch por e-mail. Durante a refeição, percebi que os ‘pings fantasmas’ tinham densidade menor e que a minha presença estava mais consciente. Até fui ao banheiro sem recorrer ao telemóvel pela primeira vez. E embora seja cliché, também reparei que comia mais devagar e estava mais presente a saborear cada prato, bem como a passear pelo Brooklyn’s Prospect Park com mais tranquilidade. Senti-me renovada e alerta, mesmo com a mudança do horário de verão a aproximar-se do fim. No entanto, segunda-feira foi um passo em frente, dois para trás: acordei com uma forte dor de cabeça e cancelei a maior parte dos meus planos. Vagueei pela casa sem coragem de pegar no telemóvel, que repousava na sua prisão improvisada. Perguntei-me se ele também sentia a minha falta — e limitado pela minha própria resistência, consegui manter a decisão de ficar sem ele.
Conclusões: o mundo real é maior que a tela e a vida não espera pelo próximo like
Ainda que não tenha a certeza de que voltarei a passar 72 horas inteiras sem telemóvel, trouxe para casa alguns princípios neo-Luddite que já incorporo no meu dia a dia. "I’d imagine you were a little more creative, less stressed and more productive," explicou-me Randy Ginsburg, fundador da Kanso Digital Wellness, quando lhe contei a minha experiência (eu concordei de imediato).\n Ginsburg fala com pessoas de todas as idades que procuram reparar a relação com a tecnologia para que ela lhes sirva — não o contrário.\n "É sobre apresentar-lhe pessoas significativas que, esperançosamente, se tornarão peças centrais do seu tecido social, para que possa passar mais tempo a fazer coisas divertidas que melhorem a sua vida — em vez de rolar isolado na tela."\n Embora eu não tenha a certeza de que serei capaz de adotar o neo-Luddismo em permanência, esta experiência serviu de lembrete de uma verdade intergeracional: o mundo real é muito maior (e mais divertido) do que a tela de um iPhone.\n\nO que achas? Comenta abaixo.